11 março, 2018

(Memória de) Regresso.

Quero-te nos detalhes:
Deslindar-te nos traços, encontrar-te nos vales,
Respirar no teu infinito,
Em cada poro ser grito, que submerge na tua voz,
Vir,
Ser por nós.
Saborear-te a vida,
Enquanto a trago desmedida,
À superfície dos teus sentidos,
Acesos, revividos,
Na minha pele, tua seara,
Casa serva do teu cheiro,
Prisioneiro, ancorado nos meus sonhos,
E resgatado, incólume, nesse último dia:
Em que da memória não restará mais que a melancolia,
Branda, solene, brisa quente,
Sombra cadente dos dias em que floresci em ti.
Onda presa à liberdade do ser inútil,
Num tempo sem verdade que se demora,
Guia da hora sem termo,
Esse demónio insuspeito,
De onde não te saberei ver,
Perdida do direito de te escrever,
Eu, ruína, labirinto,
Mas instinto,
Do meu fora de mim saberei encontrar-te:
Nos detalhes imaculados,
Decalcados, prosas vivas,
Nos versos que me deste,
Nas asas já deformadas,
Leves, por abrir.
E através das palavras descuidadas
Dos dias em que serei outro alguém
Que ninguém saberá quem,
Enquanto canto sobre o que já não conheço,
Do meu avesso,
Olharei para ti,
Enquanto tropeço,
No que estará para vir.

Viagem.

Percorro-te.
Do teu peito, atravesso a distância que fica dos dias cinzentos,
Enquanto lavro o peso amargo dos pensamentos, já livres de tempo,
Que sopro e embalo para adormecer,
Pousando-os esquecidos no horizonte dos teus ombros,
De onde a dor imaginada, submissa, calada,
Regressa doce e desnecessária,
E se desfaz devagar entre os meus dedos peregrinos, cansados,
Loucos perdidos que no teu corpo,
São sede que procura e se adivinha entre os sonhos desenhados,
Escritos na meia lua que carregas nos braços,
Onde te escondes e esperas.
E eu sinto-te.
Do teu pescoço reergo-me num forte,
De onde posso também eu ser mar,
E nessa ousadia que me acalma,
Porque sou livre, deixo-me ficar.
Troco o silêncio do mundo pelo teu compasso,
Próximo, tão próximo,
Que determinado entra pelo meu peito resgatado,
E faz morada no calor do meu sangue, prece,
Que se aquece no encontro com a tua pele,
Onde é sempre primavera,
Onde nada se perde,
E onde eu moro. E me demoro.
Como quem pertence, porque se sente,
Enfim, em casa.